segunda-feira, 28 de abril de 2025

Curso livre "Espiritualidade Barroca: entre a Liturgia e a Arte Sacra

  

 OBJETIVO GERALO curso explora celebrações litúrgicas e obras barrocas para desvendar sua riqueza espiritual e cultural. Os rituais litúrgicos católicos, como a Missa Tridentina, foram fundamentais para a produção artística barroca. A celebração da Eucaristia, central na espiritualidade católica, influenciou diretamente a arquitetura dos altares, o design das igrejas e as obras que adornavam os espaços sagrados. A arte barroca traduzia visualmente os momentos mais importantes da liturgia, como a consagração do pão e do vinho, criando uma experiência de transcendência. A interseção entre a liturgia e a arte sacra barroca não é apenas estética, mas funcional e espiritual. A arte não era um ornamento passivo nos espaços sagrados, mas um elemento ativo na vivência da fé, colaborando para transformar os rituais religiosos em experiências viscerais e transcendentes. Assim, o curso explora essa rica inter-relação, mostrando como as obras barrocas continuam a inspirar e impactar o imaginário religioso até os dias de hoje. OBJETIVOS ESPECÍFICOS: - Examinar como a arte barroca traduzia visualmente a espiritualidade católica. - Relacionar práticas religiosas e seus impactos na arquitetura e iconografia sacra. - Analisar a função simbólica dos espaços e das obras no contexto litúrgico. -Apresentar a iconografia sagrada na utilização de seus símbolos e alegorias.

CONTEÚDO: Aula 1: Traços Distintivos do Estilo Barroco na Religião: a Liturgia e seus Elementos Artísticos. O impacto da Contrarreforma na arte sacra. O Concílio de Trento (1545-1563), marco central da Contrarreforma, definiu diretrizes claras para a arte religiosa. No período barroco, a liturgia católica foi transformada em um espetáculo visual e sensorial que unia espiritualidade e arte para causar impacto nos fiéis. A Missa, especialmente a Missa Tridentina, tornou-se o centro dessa teatralidade. Realizada em latim e repleta de gestos simbólicos, cantos, incenso e uso de objetos preciosos, servia como uma encenação sagrada. O fiel não apenas assistia, mas era envolvido pelo ambiente rico em significados, intensificando sua conexão com o divino. Representação da Eucaristia em altares e pinturas.

Aula 2: Festividades de Natal, os Anjos e a Sagrada Parentela de Cristo Este período do ano litúrgico era traduzido em arte e celebrações no estilo barroco. Presépios, decorações e a atmosfera do Advento transformavam o espaço sacro emum teatro divino, onde cada elemento apontava para o mistério da Encarnação e a esperança trazida pelo nascimento de Cristo. Jesus apresenta uma linhagem antiga, sem rupturas e, principalmente, sagrada. Para isso, uma série de personagens é alinhavada numa única história de forma a confirmar essa hereditariedade. Santa Ana, São Joaquim, Santa Isabel, São Zacarias, São João Batista, São José, Virgem Maria, São Gabriel Arcanjo, São Miguel Arcanjo, São Rafael Arcanjo, A Hierarquia dos Anjos e Santos Reis. Este período do ano litúrgico era uma oportunidade para a Igreja Católica reafirmar sua mensagem de redenção e esperança.

Aula 3: Quaresma e a Semana Santa no Período Barroco A aula revela como o barroco integrou arte e devoção para criar uma vivência espiritual profunda. As obras de arte e as procissões quaresmais foram concebidas para transcender o aspecto estético, transformando-se em verdadeiras expressões de fé e ferramentas de introspecção. Reforçavam a mensagem central da Quaresma: o chamado à conversão, à penitência e à preparação espiritual para a Páscoa, permitindo que os fiéis experimentassem, de maneira sensorial e emocional, os mistérios da redenção. A Semana Santa é o ápice do calendário litúrgico cristão, culminando na celebração da Páscoa, que marca a ressurreição de Cristo.

Aula 4: Celebrações Solenes e sua Expressão Barroca A arte sacra barroca nas festividades católicas como Pentecostes, Corpus Christi, as festas de Nossa Senhora, o dia dos mortos, os rito dos sacramentos e outras celebrações do calendário litúrgico. O uso de decorações para traduzir o espírito festivo e o espiritual. As celebrações solenes eram momentos em que a comunidade se reunia para vivenciar a fé de forma intensa e compartilhada. A arte barroca, com sua ênfase no movimento, na luz e na ornamentação, amplificava a dimensão espiritual dessas ocasiões, transformando-as em experiências sensoriais e emocionais que conectavam os fiéis ao divino.

Aula 5: A Veneração dos Santos e suas Relíquias O culto aos santos desempenhou um papel essencial na vivência religiosa. Considerados intermediários entre os fiéis e Deus, os santos personificavam virtudes cristãs, sendo modelos de vida e intercessores nos desafios terrenos. A veneração ia além da contemplação espiritual: estava profundamente enraizada na crença de que os santos podiam interceder de forma tangível por milagres e graças, consolidando sua presença como figuras de devoção popular. As Relíquias (partes do corpo, objetos pessoais ou itens associados aos santos) eram vistas como canalizadores da santidade. Conectavam o sagrado ao mundo material, reforçando a proximidade entre o divino e os fiéis. A Igreja incentivou fortemente o culto às relíquias como uma resposta espiritual à Contrarreforma, reafirmando a materialidade como instrumento de conexão espiritual, em oposição à iconoclastia protestante. Aula 6: Arquitetura como Experiência Espiritual no Barroco Catedral Basílica do Salvador. A arquitetura das igrejas foi planejada como um meio para elevar o espírito humano e criar uma experiência sensorial e emocional que conectasse o fiel ao divino. Diferente do Renascimento, que buscava a harmonia e a proporção como reflexo da razão humana, a arquitetura barroca enfatizava o drama, o dinamismo e a teatralidade. A igreja barroca não era apenas um espaço de culto, mas também uma obra de arte total, onde cada elemento – luz, movimento e ornamentação – contribuía para provocar uma experiência espiritual profunda.

A quem se destina: O tema fornece subsídios teóricos e metodológicos essenciais para quem se dedica ao estudo da arte sacra e do período Barroco. Ao explorar as conexões entre arte, religião e sociedade, o conteúdo ajuda a contextualizar obras artísticas, analisar sua simbologia e compreender os processos históricos que influenciaram sua produção. Os interessados em História, por sua vez, encontram uma oportunidade para investigar o impacto cultural e político do Barroco no contexto da Contrarreforma e sua contribuição para a formação de identidades culturais. O conteúdo é especialmente relevante para religiosos e pesquisadores interessados na interseção entre Espiritualidade e Arte. Permite uma análise mais profunda da simbologia religiosa, do papel da arte na catequese e da maneira como os valores espirituais do período influenciaram práticas devocionais. Essa abordagem contribui para o entendimento das tradições religiosas e sua expressão artística, promovendo uma reflexão sobre o legado do Barroco na vivência espiritual atual.

A QUEM SE DESTINA:O conteúdo oferece embasamento para estudiosos de Arte, historiadores, profissionais ligados à Literatura e Comunicação Social, religiosos, pesquisadores, professores que pretendam desenvolver o tema em sala de aula, profissionais de todas as áreas, estudantes universitários e interessados em geral.

Professor: Marcos Horácio Gomes Dias é um acadêmico com uma formação diversificada e sólida, evidenciada por seus títulos acadêmicos e áreas de especialização. Doutor em História Social pela PUC-SP, o que indica um aprofundamento teórico e metodológico na análise de fenômenos históricos ligados à sociedade. Seu Mestrado em História Social pela USP demonstra a continuidade de sua formação, com ênfase em temas que conectam sociedade e cultura. A pós-graduação em Arte e Cultura Barroca pela UFOP, pelo Instituto de Filosofia, Arte e Cultura, destaca a especialização em um campo altamente específico, a cultura barroca, especialmente relevante no contexto do Brasil. Além disso, seu Bacharelado em Ciências Sociais e História pela USP lhe confere uma base interdisciplinar, unindo a análise sociológica e histórica. Com uma formação multidisciplinar, Marcos Horácio contribui para o entendimento das interações entre arte, história e sociedade. Sua experiência em patrimônio histórico é relevante para a preservação cultural, especialmente no Brasil, onde os estilos barroco e rococó têm grande importância histórica e estética. Aborda também temas da Teoria da Cultura e da Produção da Imagem, oferecendo uma perspectiva crítica sobre como as obras de arte e outros registros visuais são produzidos e utilizados para moldar narrativas históricas e identidades culturais. Além disso, suas reflexões sobre a realidade socioeconômica e política brasileira sugerem uma visão contextualizada, que conecta a arte e a cultura ao cenário histórico mais amplo. Atualmente é professor do Museu de Arte Sacra de São Paulo e da Universidade São Judas Tadeu

Período: 21 á 26 de julho Horário: das 15h às 17h Carga horária: 20h Valor: R$ 400 reais

Inscrições: inscricoes2025cursos@gmail.com Informações Whatsapp: +55 (71) 99129-3143

Local: Auditório do Instituto Geografico Histórico da Bahia Endereço: Praça da Piedade, Av. Joana Angélica, 43 - Nazaré, Salvador - BA, 40050-001 No final do curso o aluno receberá o certificado

BIBLIOGRAFIA ALBERTI, L. B. (trat.) Da pintura. Campinas: Editora da Unicamp, 1989.ARENAS, J.F.; BASSEGODA I HUGAS, B. (ed.). Barroco en Europa. Barcelona: Gustavo Gili, 1983. ARISTÓTELES. Arte retórica e arte poética. Rio de Janeiro: Tecnoprint, 1969. ARGAN, G.C. Arte e crítica de arte. Lisboa: Editorial Estampa, 1993. _____. “Il valore critico della ‘stampa di traduzione’”. In: Immagine e persuasione: saggi sul barocco. Milano: Feltrinelle, 1986. p. 3-9. _____. História da arte como história da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1992. _____. Imagem e persuasão: ensaios sobre o barroco. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. ARNHEIN, R. Intuição e intelecto na arte. São Paulo: Martins Fontes, 1989. _____.Arte e percepção visual. São Paulo: Livraria Pioneira, 1991. ÁVILLA, A.; MACHADO, R. e GONTIJO, J. M. M. Barroco Mineiro: Glossário de Arquitetura e Ornamentação. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro/Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1996. BAROCCO E ROCOCÒ: Architettura, scultura, pittura. Novara: Instituto Geográfico DeAgostini, 1991. BARTHES, R. “O efeito de real”, In. O rumor da língua. Lisboa: Edições 70, 1984. _____. “Retórica da Imagem”. In: O óbvio e o obtuso: ensaios críticos III. Lisboa: Edições 70, 1984. BAZIN, G. Arquitetura religiosa barroca no Brasil. Rio de janeiro: Record, 1983. BECKETT, W. História da pintura. São Paulo: Ática, 1997. BELLINI, Leandro. Arte Sacra e Iconografia Cristã. Curitiba: Editora UFPR, 2006. BENJAMIN, W. A origem do drama barroco alemão. São Paulo: Brasiliense, 1985. _____. Magia/técnica: arte/política. São Paulo: Brasiliense, 1987. BOULTING, Noel. O Sentido das Imagens: Iconografia e Simbologia Cristã na Arte Barroca. São Paulo: Loyola, 1996. CABRAL, Maria Eugênia de Carvalho. Barroco, a Arte da Contrarreforma: Contexto, Liturgia e Simbolismo. São Paulo: Editora Unesp, 2015. CAMPORESI, P. Hedonismo e exotismo: a arte de viver na época das luzes. São Paulo: Unesp, 1996. COSTA, L. M. “Talha, imaginária, pintura e mobiliário (século XVIII)”. In: História da cultura brasileira. Rio de Janeiro: MEC, 1976. vol. 2. DEL NEGRO, C. Do ornamento. Rio de Janeiro: Universidade do Brasil, 1961 D’ORS, E. Du baroque. Paris: Gallimard, 1968. DURAND, Gilberto. Ritual e Barroco na Arte Sacra Brasileira. São Paulo: Perspectiva, 1995. GOMBRICH, E. H. A história da arte, Rio de Janeiro: Guanabara, 1993. ______. Imagenes simbólicas: estudios sobre el arte del renascimento. Madrid: Alianza Editorial, 1986. (Alianza Forma; 34) _____. Norma e forma. São Paulo: Martins Fontes, 1990. _____. Arte e ilusão: um estudo da psicologia da representação pictórica. São Paulo: Martins Fontes, 1995. HAUSER, A. Teorias da arte. Lisboa: Presença, 1973. _____. História social da arte e da literatura. São Paulo: Martins Fontes, 1995. _____. Fundamentos da la sociologia del arte. Madrid: Guadalama, 1975. _____. Maneirismo. São Paulo: Perspectiva, 1993. (Col. Stylus, 2) MINGUET, P. Estética Del Rococó. Madrid: Catedra, 1992. PAIVA, José Roberto de Castro. O Barroco e o Sagrado: Arte e Religião na América Portuguesa. Belo Horizonte: Editora PUC Minas, 2009. RIBEIRO Alcyr Lacerda. A Missa no Contexto do Barroco Brasileiro. Belo Horizonte: EdUFMG, 2007. SOARES, Bruno Monteiro. Espaço Sagrado e Arquitetura: Igrejas Barrocas no Brasil. Rio de Janeiro: Zahar, 2012. SCHINAPPER, Antoine. O Barroco: As Luzes e as Sombras da Fé. São Paulo: Martins Fontes, 1999. WÖLFFLIN, H. Conceitos fundamentais de história da arte. São Paulo: Martins Fontes, 1989a. _____. Renascimento e barroco: estudo sobre a essência do estilo e sua origem na Itália. São Paulo: Perspectiva. 1989b


domingo, 21 de julho de 2024

CARACTERÍSTICAS DA ARTE BEURONENSE

    O nome “Estilo beuronense”, é denominação proveniente do local em que nasceu esta escola artística, no final do século XIX, isto é, a Abadia de Beuron, na Alemanha.


Abadia de São Martinho Beuron - Alemanha



    Reunindo temas da arte egípcia e grega, o “estilo beuronense” caracteriza-se pelo traço hierático e litúrgico de suas figuras. A arte pagã é, com este estilo, elevada de forma a poder exprimir verdades eternas. É uma arte de beleza clássica, rígida, com linhas puras, distintas, cujas figuras traduzem respeito e atenção. Os traços do pincel do artista lembram muito as antigas iluminuras utilizadas pelos monges copistas. É particularmente sacral a contemplação das pinturas conduzindo à oração, à adoração, ao recolhimento. A arte beuronense desenvolveu-se paralelamente ao renascimento litúrgico e à reforma do canto gregoriano. 





Igreja da Abadia de Beuron




Ateliê de pintura de Beuron


            No Brasil, o estilo beuronense chegou juntamente com os monges da Congregação de Beuron, no início do século XX, que vieram reformar os antigos mosteiros beneditinos do país, que estavam agonizando em conseqüência da política contrária aos religiosos do governo imperial, notadamente o fechamento dos noviciados. O Mosteiro de São Bento, de Salvador, reúne em seu acervo seis painéis em arte beuronense. Na atual Sala capitular e no refeitório dos Monges, pintados pelo Irmão Lucas Reicht, Monge Beneditino Austríaco, elaborados em 1910, o interior de ambos os espaços é decorado pelos painéis. A temática diverge, enquanto na sala capitular a temática é a vida espiritual, no refeitório o tema é o alimento, ora se utilizou passagens da Bíblia Sagrada e da hagiografia de São Bento.

           
As bodas de Caná


Última ceia


Milagre da Farinha


Visitação de Nossa Senhora da Santa Isabel


O juízo final


Trânsito de São Bento













quinta-feira, 30 de julho de 2020

Arquivo Histórico do Mosteiro de São Bento da Bahia


Arquivo Histórico do Mosteiro de São Bento da Bahia

  Seguindo a longa tradição beneditina de salvaguardar o conhecimento adquirido ao longo dos séculos, encontramos dentro do Arquivo Histórico do Mosteiro de São Bento da Bahia toda a memória da Congregação Beneditina do Brasil como também do primeiro Mosteiro fundado no novo mundo.




No acervo do arquivo, veremos obras cujas datas vão desde o século XVI até o XXI, escritas em diversos idiomas como: latim, alemão, grego, português arcaico e moderno, além de manuscritos dos primeiros momentos da instalação da primeira casa beneditina, fundada no Brasil, textos de teologia, filosofia, história da Igreja, História do Brasil, os preciosos 5 volumes do livro do tombo do Mosteiro de São Bento da Bahia, onde encontramos o testamento da índia tupinambá princesa Catarina Paraguaçu, benfeitora deste Mosteiro. 




 Sendo um arquivo prioritariamente monástico, ele reserva, ainda, um precioso espaço para documentos relacionados à vida dos monges e abades beneditinos que viveram neste mosteiro, bem como crônicas da comunidade monástica de períodos diversos, passando pelos primeiros fundadores portugueses aos reformadores alemães do século XIX, livros de registro de missas, documentos históricos relativos à invasão holandesa de Salvador em 1624, breves pontifícios etc. Dentre as raridades preciosas que enriquecem as prateleiras rolantes, encontram-se alguns incunábulos que são livros impressos nos primeiros tempos da imprensa com tipos móveis, não escritos à mão, dentre eles possuímos beatus sententias duns scotus datado de 1503.



história da biblioteconomia nos mostra não somente o papel que fora utilizado na confecção dos livros, como também outros materiais, que dignificam o valor da coleção bibliográfica que foram utilizados para adornarem os frontispícios dos livros. No arquivo, encontraremos dentre eles: veludo, couro de carneiro e porco, ouro, prata  etc. Algumas coleções são únicas, como a biblioteca de ouro, composta de títulos comprados na Europa, após a II guerra mundial, organizada pelo antigo arquivista Dom José Edres, OSB. Em sua maioria escritos em alemão e latim. Publicações da antiga tipografia beneditina, que teve sua sede no Mosteiro de São Bento da Bahia, dentre eles o primeiro missal bilingue latim e português, organizado por Dom BedaKeckeisen,OSB, com ilustrações de Ir. Paulo Lachenmayer,OSB o Mosteiro de São Bento da Bahia de autoria de Dom Gregório Müller,OSB, e a monumental obra Os artistas do Mosteiro de São Bento do Rio de janeiro de autoria do pesquisador Dom Clemente Maria da Silva Nigra,OSB. Outros autores importantes se fazem presentes como é o caso de Frei Vicente do Salvador, respeitável cronista que nos narra fatos interessantes do período colonial em sua obra História do Brasil.



As cartas de profissão monástica dos Monges são um importante legado desta instituição monástica, se estendem do século XVI ao XXI, são a fórmula da profissão religiosa monástica, lida no ato de sua consagração ao tornarem-se monges, de linguagem própria se distinguem tanto pela singeleza quanto riqueza da decoração com iluminuras. Um outro repositório importante são o conjunto de fotos que registra a vida dos monges da congregação beneditina, com registros desde o nascimento da fotografia.



Livros litúrgicos ricamente decorados com iluminuras e capitais ocupam o espaço do arquivo, como missais, lecionários em latim que possuem capas ricamente decoradas e que foram utilizados na liturgia da missa, e agora estão guardados para que sejam preservados da ação do tempo. Um grupo diverso e importante é o de livros que passaram pelo processo de restauro e na sua maioria perderam a capa original, tendo, porém, seu conteúdo preservado, recebendo a encadernação monástica com a capa de couro de carneiro curtido.




O arquivo do Mosteiro de São Bento é procurado por uma infinidade de pesquisadores das mais diversas aéreas do conhecimento, que buscam enriquecer seus trabalhos com informações verídicas, dando assim respaldo aos seus estudos.


terça-feira, 25 de junho de 2019

Elementos Iconográficos do Retábulo do Altar da Capela - mor do Mosteiro de São Bento da Bahia


A Ordem de São Bento é a primeira grande ordem monástica da Igreja do Ocidente. Os beneditinos estão implantados no noroeste da península Ibérica desde o séc. XI ainda antes de Portugal existir como nação independente. Os Mosteiros das ordens religiosas funcionavam como coluna vertebral da conquista cristã e recebiam com isso os favores dos reis católicos, mas foi a partir do século XVI quando foi escolhido como sede da Congregação de São Bento de Portugal e do Brasil que o Mosteiro de Tibães cresceu em prestígio e esplendor.


Vista do altar - mor da Igreja do Mosteiro de São Bento da Bahia,Século XIX
Fonte: Arquivo do Mosteiro de São Bento da Bahia

No século XVI, aportaram na Bahia de Todos os Santos os primeiros monges beneditinos que viam da suntuosa Abadia de São Martinho de Tibães. Os monges bentos como eram chamados vieram para fundar na Terra de Santa Cruz após 81 anos do “descobrimento” o primeiro Mosteiro de todo o novo mundo. Essa fundação é motivada pelo impulso missionário além-mar, incentivado pelo Concílio de Trento. Assim os beneditinos trouxeram todo o seu amplo conhecimento e cultura para a construção do novo Mosteiro usando toda a beleza e funcionalidade da arquitetura para a construção da nova casa, Calmon nos apresenta o panorama histórico:

A primeira ordem regular estabelecida no Brasil depois da Companhia, foi a de São Bento. Vimos os primeiros dêsse hábito às voltas com a conquista da Paraíba. Constou no Capítulo da mesma comunidade celebrado em Lisboa, em 1581, o pedido dos moradores da Bahia, para que viessem instalar-se aqui “monges desta nova reforma para sua consolação”. Realmente foram acolhidos com grande deferência e lhes deu o bispo a ermida de São Sebastião, já existente na rampa fronteira à porta da cidade, que se chamou de São Bento onde se elevou, enorme e rico mosteiro, que subsiste. No ano seguinte logravam os beneditinos as preferências da velha Catarina Àlvares, que em testamento (diferente de Caramuru, amigo dos Jesuítas), lhes legou as terras adjacentes da ermida de Nossa Senhora da Graça…[1]

A arte foi a mais poderosa arma que a Igreja Católica esgrimiu na guerra contra o movimento protestante. No início do século XVI, o sacerdote e teólogo alemão Martinho Lutero atacou severamente a veneração às imagens dos santos. Assim reagindo à ameaça, o Papa Paulo III convocou em meados do século XVI o Concílio de Trento, atribulado, o Concílio durou 18 anos e ficou conhecido como “Concílio da contra reforma”, deu início a uma serie de diretrizes que visavam a reafirmar e reforçar os dogmas e a disciplina dentro da Igreja Católica: a saber as imagens de Cristo, da Virgem e dos Santos eram utilíssimas para o culto num mundo onde a esmagadora maioria não sabia ler. A arte é a expressão plástica dos ideais católicos da contra reforma, pois é com imagens que também se instrui o povo por que o povo vê com o coração. A exuberância dos símbolos religiosos era a melhor forma de honrar a Deus, de persuadir e de aumentar o exército de crentes.
Ao edificarem a Igreja do Mosteiro de São Bento da Bahia os monges beneditinos legaram-nos um dos exemplares mais preciosos da história patrimonial. Ao construírem o seu templo e ao exprimirem a sua fé através das expressões artísticas que para aí criaram atingiram um sublinhar estreito entre a liturgia e a arte e conseguiram que o seu mundo cultual se transformasse num mundo cultural
O atual templo dos monges Beneditinos da Bahia foi erigido de acordo com a planta do Irmão Donato Frei Macário de São João, este membro da comunidade veio junto com o grupo de Monges fundadores liderados pelo Frei Antônio Ventura, primeiro Abade do mosteiro nascente, assim cita Dom Gregório Müller:

“Idealizou a planta do novo edifício um membro da comunidade, o irmão Donato Fr. Macário de São João, do qual guarda o “Dietário” a seguinte memória: Fr. Macário de S. João trabalhou no ofício da arquitetura até morrer com grande zelo e desvelo... Deixou disposta em parte a planta deste mosteiro e da igreja nova com clareza necessária para sua execução. Faleceu aos 3 de abril de 1676. ”[2]


A Basílica dedicada ao mártir São Sebastião que está em destaque ao centro do retábulo aparece, Santo que dá nome à Basílica, nascido na Narbona, na Gália, e que foi centurião romano. É representado com a cara rapada e semblante juvenil, amarrado a um tronco de árvore, sofrendo o martírio das flechas, lenço cobrindo parte do corpo e por trás das pernas suas vestes de guerreiro.
Imagem de São Sebastião
Patrono da Basílica do Mosteiro de São Bento

Foi construída ao longo de vários abaciados, isso ocorreu por diversos motivos dentre eles a falta de recursos financeiros. A construção da mesma iniciou-se em 1680. A construção do atual retábulo - mor e de toda a igreja do mosteiro vêm da mentalidade da época de que tudo o que Deus nos dar para Ele deve se converter, é um testemunho que nada é demais para a casa de Deus. 
             Altar - Mor antes de ser deslocado do retábulo.

Finalizando a sequências das capelas laterais dois púlpitos, executados em mármore possuindo uma leve decoração através da técnica de marchetaria colorida estão fixando nas colunas que antecedem o transepto que dar acesso a capela-mor. Na parte frontal o brasão da Ordem Beneditina em relevo, o uso de brasões nas Igrejas são a marca que este templo pertence a uma determinada Ordem Religiosa. Na base dos mesmo simbolicamente anjos sustentam a estrutura superior onde o sacerdote proferia o sermão da missa. O conjunto de anjos trazem nas mãos fitas e nestas mensagem referentes a culto divino celebrado, do lado direito a expressão latina Praedica Verbum que é uma menção muito clara a exortação de Paulo a Timóteo: praedica verbum, insta opportune, importune... Erit enim tempus, cum sanam doctrinam non sustinebunt (2 Tm 4, 2-3).  Traduzindo em resumo essa advertência válida, sem dúvida, também nos nossos dias que é um convite do Apóstolo a pregar e anunciar a Palavra de Deus.





Já do lado esquerdo temos igualmente outro púlpito mas com a exortação agora do Antigo Testamento da passagem do início da Profecia de Isaias 58, a expressão latina é "Clama ne Cesses" que significa Clama em alta voz, como consta na imagem abaixo:



A chegada do conjunto do altar coincide com a substituição dos retábulos de madeira policromada e dourada pelo mármore, cujas mudanças começaram a ocorrer na segunda metade do séc. XIX. Assim nos diz Freire em relação a esta mudança estilística:

Ao longo do século XIX as irmandades, ordens terceiras e algumas ordens de religiosos regulares empreenderam reformas no interior de seus edifícios “[...] que consistiram no desmonte e destruição da antiga ornamentação em madeira entalhada, policromada e dourada erigida no século XVIII, e na substituição por outra ornamentação que fosse mais adequada à concepção estética e cultural daqueles novos tempos”. Destaca que o período mais frutífero em todo esse processo deu-se na primeira metade dos oitocentos, coincidindo com “[...] a vigência do primeiro período de prosperidade econômica, os 20 anos de depressão e fase posterior de recuperação”. Sendo prejudicada pela última fase de depressão acontecida de 1865 a 1888.[3]

O atual retábulo, que é o nosso principal objeto de estudo foi inaugurado e aberto ao público no dia 11 de julho de 1871, justamente segue o programa arquitetônico devido do Concílio Tridentino de que os santos deveriam ter o seu lugar de destaque, e assim vemos as figuras de São Bento e Santa Escolástica cada uma em seu nicho individual que é coroado com uma abóboda ou semi-cúpula. E ao centro São Sebastião trazendo em seus pés os atributos que o distingue como soldado romano (espada, armadura, capacete). O altar-mor com o respectivo retábulo, segundo a nota de encomenda e compra existente no arquivo do arquicénobio baiano, foi encarregada da execução a casa Fratelli Sechino, em Gênova – Itália, assim trata a cronica religiosa:


Esta obra monumental fôra continuada pelo plano primitivo, em 1854, sendo D. Abbade deral o padre-mestre Fr. Saturnino de Santa Clara Antunes, que governou até 1860, deixando encomendado altar e retabulo de pedra, de que foi incumbido o finado negociante Sechino, eu o fizera aos melhores esculptores da Italia, do mais fino marmore.[4]


Está à capela-mor toda ladeada por trígrifo elemento arquitetônico da arte neoclássica derivado dos templos gregos que demarcava o espaço onde era adorado o deus ou a deusa. Já na cultura cristã ele demarca o espaço do Deus dos cristãos. O programa ornamental do retábulo é neoclássico arqueológico, ou seja, os padrões que foram encontrados nas escavações presentes em Herculano e Pompeia.


Projeto do teto da capela - Mor com as tribunas, Século XIX

Fonte: Arquivo do Mosteiro de São Bento da Bahia


O conjunto escultórico em mármore de carrara foi trazido do além-mar (Itália) trázido desmontado em conjuntos de peças e aqui montado, tendo suas bases de alvenaria. Inspirado na cultura neoclássica apresenta elementos próprios da ornamentação do mundo grego e da arte cristã. Prender-nos-emos ao significado dos elementos no tocante à arte cristã. Erguem-se quatro colunas de ordem compósita, com frisos decorados com folhas de acanticas, frutos, pássaros, grinaldas e seres fantásticos. Assim sendo, a folha de acanto tem o significado da vitória daqueles que permaneceram fiéis ao seguimento de Cristo. O tratamento no chão da capela - mor é ricamente ilustrado com figuras geométricas.
Detalhe da ornamentação da coluna do retábulo

O chão da capela maior está todo ladrilhado á pedra mármore formando estrelas, e o mesmo ladrilhado continua em grande parte da nave, que depois de concluída a obra deve fica do mesmo modo ladrilhada. O mármore da obra da capella, mão-de-obra de tudo que está feito orça em mais de 300 contos de reis.
Ornamentação do chão da capela - mor 
Mosteiro de São Bento da Bahia

Na base do retábulo encontram-se quatro brasões em alto-relevo com atributos direcionados para a Sagrada Escritura e as celebrações litúrgicas ali realizadas. No primeiro brasão, vêem-se as tábuas dos dez mandamentos, uma cruz, ao fundo um ramo de palmeira e os três elementos envolvidos no ramo da figueira, no segundo temos um castiçal, um cálice, uma pala, um turibulo e a palma da palmeira com o ramo da videira envolvida nos objetos, na quarta: uma custódia, uma naveta e uma cruz grega, um lecionário envolvido por uma estola, mitra e báculo.
Ao olhar para o arco do triunfo que coroa o retábulo visualiza-se três figuras: Fé, Esperança e Caridade. Tais virtudes são chamadas de virtudes teologais e as encontramos na Sagrada Escritura no capítulo primeiro da Carta de São Paulo aos Coríntios. São elas virtudes sobrenaturais que todo cristão deve se esforçar a praticar em sua vida. Essas virtudes foram exaltadas na decoração das igrejas sobretudo no século XIX, para acentuar o combate contra os vícios capitais. De acordo com Freire (2006, p.419) “A alegoria das virtudes teologais foram as mais constantes e enfatizadas na talha baiana do Oitocentos. Isso porque são as principais virtudes e representam a essência da mensagem que a Igreja Católica desejava transmitir para os seus fiéis”.
Detalhe da liturgia na capela - mor

A mesa do altar-mor hoje deslocada de seu local original junto ao retábulo por conta das mudanças litúrgicas do Concílio Vaticano II, apresenta uma série de elementos tais como as tradicionais folhas de acanto. Depois nos lados folhas de videira e trigo ambas remetendo-se a simbologia eucarística do pão e do vinho. Ainda pavões nas laterias da mesa do altar significam a beleza do paraíso e finalmente ao centro do altar-mor a figura do pelicano ave enigmática que na simbologia cristã é referência do sacrifício de Cristo por toda humanidade ferida pelo pecado. 


Resultado de imagem para altar mor dos beneditinos pelicano






No alto nas paredes laterais da capela temos seis tribunas coroadas com rocailles conchas. Completa a ornamentação da capela os duas telas de grandes proporções de São Gregório Magno e Santa Hidelgardes encomendados em 1880 ao pintor genovês Paolo A. Ferraro.


Detalhe do quadro de Santa Hildegardes 
e o cadeiral monástico.

Completam o conjunto a mesa do altar, as credências e em plano inferior do corpo da capela-mor estão o cadeiral, ou estalas (em madeira), para a celebração dos ofícios, e as balaustradas em mármore coroadas por anjos que separam o espaço da capela-mor do transepto e da nave da igreja, para marcar a distinção entre o espaço reservado aos monges e a assembleia dos fiéis.

Dom Anselmo Rodrigues, OSB











[1] CALMON, Pedro. História do Brasil. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editôra,1963.
[2] MULLER. Gregório Os beneditinos na Bahia. Tipografia beneditina. Salvador-BA.
[3] FREIRE, Luiz Alberto. A talha neoclássica na Bahia. Rio de Janeiro: Versal, 2006.
[4] CÓDICE 34 – Capela-Mor 1860 – 1872. Salvador, Arquivo do Mosteiro de São Bento da Bahia.